domingo, 9 de abril de 2017

Budo Budo


Budo, do crioulo forro, significa pedra em português.

Para qualquer santomense “budo” é uma palavra forte com mais do que um significado e que ganha outros sentidos dependendo do contexto em que for utilizado.  Pedra, esta matéria geológica, este ser inanimado, rija, rude, resistente, agressivo, é uma arma de combate violento e também é um elemento que ajuda a erguer estruturas de um edifício. A metáfora do “budo” está tão presente nas memórias do Valdemar Dória que este recorda e conta histórias da sua infância em São Tomé para falar do basalto, a pedra vulcânica mais comum no arquipélago, que convive mergulhado poeticamente na rocha vermelha, de oxido de ferro, no mar, no rio e pico mais próximo do céu insular.  

Assim, “Budo Budo”, que é “pedra a pedra”, é a metáfora para o artista construir o seu discurso expositivo. Ora contando narrativas, com descrições gráficas muito saturadas e outras vezes simplificando a sua composição a um único elemento formal centralizado no suporte pictórico. Nesta exposição, ele trás ao observador um conjunto de trabalhos de escala reduzida, mas de uma matéria plástica de grande luz, pois a ausência no preto de marfim muito utilizado para definir as formas não fora utilizado.

Não é a primeira vez que o Valdemar pinta sobre objectos funcionais como a “gamela”, cujo formato redondo obriga-o a inovar o tratamento plástico das suas criações.

Se através desses objectos tradicionais há uma ligação com a matriz identitária na qual recorre frequentemente para encontrar justificações das suas realizações, também é verdade que em simultâneo esses referentes culturais são suportes estruturais para recriar um diálogo capaz de revelar intencionalmente o caminho que pretende construir. Entre a memória etnográfica e as vivências urbanas, o artista experimenta imprimir novos significados, de sentimentos contraditórios próprios do tempo actual em que as incertezas socioculturais, económicas e políticas estão muito presentes.

Na Lilliput, talvez a mais pequena galeria do mundo, situada num belo espaço a beira-rio na Vila franca de Xira podemos visualizar o ambiente que tenha, talvez, inspirado o Valdemar Dória a apresentar esta proposta plástica carregado também de significados emocionais das suas vivências urbanas lisboetas e memórias de infância.

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