quarta-feira, 12 de julho de 2017

Precocemente iniciei o meu caminho.

Em doze de Julho de 1979 a comissão dos festejos da independência de São Tomé e Príncipe organizou duas grandes exposições. A primeira foi a grande mostra da pintura angolana no salão de exposições do Parque Popular, na qual, entre muitos outros artistas, participaram dois grandes nomes da arte desta rica terra, Victor Teixeira (Viteix) e Eleutério Sanches - que vinte e dois anos depois haveria de conhecer em Lisboa e tornar-se um dos meus grandes padrinhos nesta cidade que ainda não sonhara vir a ser a minha.

Presto a mais nobre homenagem a estes dois senhores da arte angolana.
A segunda foi outra grande mostra da arte popular, no Pavilhão das Ilhas, uma espectacular construção em madeira que por si só se tornou um ex-líbris no Parque Popular.


Participei nesta mostra com trabalhos muito infantis, como a idade impunha, mas com qualidade criativa e de execução que não deixou os organizadores da exposição indiferentes. O meu avô materno, Veoide Pires dos Santos, conhecido no país como o maior artesão tartarugueiro, muito contribuiu para que efectivamente tudo acontecesse, pois foi o avô babado que revelou orgulhosamente os desenhos a todas as pessoas que visitavam a oficina da Chácara. O Senhor Esteves, o marceneiro da Rua do Rosário, fez as molduras desses mesmos desenhos. Molduras essas que imprimiram muita qualidade aos desenhos. Ao vê-los, tive a sensação de ser capaz de fazer um dia uma verdadeira obra de arte.
Esta experiência abriu-me as portas para continuar ingenuamente pintando, mas já com o sonho de me tornar no futuro um grande mestre das belas artes.


Nunca mais me esqueci destas duas exposições. Nunca mais! A memória revela-se resistente diante uma experiência visual e estética que maravilhou toda a minha infância e adolescência.
Em 1982, três anos depois de exibir precocemente o meu trabalho ao grande público, Ovídia, minha querida mãe, falou com Protásio Pina na Cerâmica de Almerim para que me orientasse na modelação, por se ter apercebido que eu precisava de um mestre para potencializar as minhas capacidades criativas. Eu já conhecia as pinturas de Protásio e de Cesaltino da Fonseca, que eram dois jovens artistas que maravilhavam as ilhas com os seus trabalhos, mas foi em Almerim que nos conhecemos de perto e nos tornámos amigos para sempre. Juntando-se mais tarde Filipe Santo. Um ambiente de arte e de amizade.


Aos treze anos assumo o meu caminho de futuro artista, nada mais sendo obstáculo na formação como artista plástico. Para isto muitas foram as pessoas que acompanharam de perto e contribuíram para o meu crescimento: A madre Conceição, Ovídia Pires dos Santos, a minha mãe e os meus irmãos Aplínio e Afrânio, os meus avós Hilária de Almeida e Veoide Pires dos Santos, Roberta Pires dos Santos, I.Fatima Vera Cruz, Ladislau de Almeida, José Viana, Cesaltino da Fonseca, Protásio Pina, Luís Pina, Jone, Zemé, Dona Alda Espírito Santo, Luísa Albuquerque, Júlio Campos, São Deus Lima, Eustáquio Lombá, Faustino Pires dos Santos, Manuel Silva Pereira, Manuel Lopes Poppe Cardoso, Jean Pierre, professor Maurice Elbaz, Alain Leilarvegne…


Muitos nomes ficam por escrever porque não há espaço suficiente para escreve-los. Destaquei alguns, mas é meu desejo que todos se sintam incluídos, pois sei que todos os meus amigos, sem excepção, estiveram sempre por perto e cada um com o seu contributo marcaram e vão marcando a minha vida pessoal assim como artística. 


12 de Julho de 1979 é uma data que não posso esquecer porque foi um marco que deu início a toda a minha história artística.




terça-feira, 11 de julho de 2017

Não à morte antecipada de São Tomé e Príncipe

O dia 12 de Julho, data dos festejos da independência de São Tomé e Príncipe, dentro e fora do país alguns cidadãos de forma isolada lançaram várias campanhas de manifestação do descontentamento por causa do péssimo estado de desenvolvimento que o arquipélago tem atravessado, convidando ou instigando as pessoas a vestirem-se de luto ou no facebook mostrarem o luto sob a bandeira nacional, mostrando a tristeza deste povo.
Com respeito a todas as opiniões.
O luto é a manifestação de tristeza resultante da morte duma pessoa; a morte de um grupo de pessoas; a morte de um povo. 
O facebook, para quem não sabe digo, é uma máquina da rede social que utiliza recursos de manipulação de sentimentos, por isso o dramatismo de qualquer espécie provoca mais reacções das pessoas. Por ser um meio mais mediático, o sensacionalismo e a crítica absorve maior visibilidade e reacções… Há que saber utilizá-lo.
Se São Tomé e Príncipe e o seu povo não estão na agonia da morte, penso que não devemos matá-los antes do tempo (natural).
Que é triste o estado do país e que qualquer cidadão goza do direito de se manifestar tristemente concordo plenamente. O que descordo é viver-se o luto de quem ainda não faleceu. Seria como cometer o crime de matança psicológica para gozar a tristeza com o belo prazer de se manifestar.
O país está doente, então vamos curá-lo.


Continuo a pensar que não devemos perante o paciente enfermo e sofredor, como é o povo de São Tomé e Príncipe, de luto antecipando a sua morte. Como este se sentiria? 
Motivos de tristeza? Há muitos. E também há muitas formas de o manifestar. 
O luto? O luto só depois da morte.


Esta ideia de luto daria uma bela performance artística… !
Em conversa privada com vários santomenses na rede social sobre este assunto, quase todos justificavam as razões da tristeza e descontentamento com o luto. Entretanto, o luto em si não era a razão para a manifestação porque não houve morte nenhuma. Nos fundamentos para a utilização do luto, devemos entendê-lo como sendo a cor preta. Cor esta que psicologicamente significa tristeza. Entendamos também que para um santomense a cor “preta” é também denominada cor de “luto”. Então, preto é o mesmo que luto. É um problema de linguagem e cultura que devemos entender. E por causa das particularidades desta linguagem peculiar dos santomenses, podemos entender tudo erradamente...
Observemos as imagens utilizadas nestas campanhas para fazermos o seu correcto enquadramento social e percebermos o impacto visual dos objectivos propostos pelos manifestantes cibernáuticos:


1 – imagem de cor de luto.

2 – Imagem de cor preta.


A diferença que vai de uma para a outra é o texto. Ao se utilizar a palavra “luto” sobre o quadrado preto a imagem ganha outro sentido, o que significa que existe uma clara intensão de manifestar com o luto e não com o preto. Logo, entende-se que houve morte. Ou há uma clara intenção de se matar psicologicamente o povo ou o governo. Mas o luto para o governo não é o luto para São Tomé e Príncipe em que genericamente se enquadra o povo.

E então…?

Não estou de luto do meu povo que felizmente ainda não morreu como muitos o querem fazer. Tenho muito esperança.
Por São Tomé e Príncipe sempre positivo.